Nos campos dos esquecidos
Malte. O ingresso do hangar de Hal Far.
Enclausurados, à chegada, em centro fechados, os exilados que são identificados como “vulneráveis” foram repartidos pelos centros de acolhimento abertos. Um deles está reservado para as famílias. Chama-se Hal Far e fica no terminal de uma linha de autocarros, ao lado de lojas e de casas normais, à beira das pistas e um aeroporto abandonado.
É lá que vivem cerca de trinta famílias, à espera de protecção internacional. Quase sempre húmido, o ar, ali, é sufocante no verão e glaciar no inverno. Vindo de Tripoli com a mulher e o filho de dezasseis meses, Dawit, um etíope de 35 anos, faz parte dos moradores de infortúnio do hangar. “Agradeço às autoridades maltesas que salvaram o meu barco do naufrágio e que nos acolhem”, diz ele, em jeito de preâmbulo. “Mas é preciso dizer que este lugar é terrível, verdadeiramente terrível. Somos somalis, etíopes, eritreus e alguns ganeses e argelinos. Aqui só há famílias com crianças. O mais novo tem um mês e meio. E também há uma mulher que deu à luz à chegada. Tiraram-na do centro de detenção e quando o bebé nasceu, voltaram a trazê-los para cá.”
“Estamos todos esgotados”, continua ele, “E onde é que nos metem? Neste hangar, onde tudo é sujo e perigoso. Temos falta de luz, há apenas dois néons para isto tudo e nada que nos ilumine nas tendas. O pavimento está oleoso, a drenagem de água está avariada, os ratos correm por todo o lado. Tudo isto é tóxico. Os bebés metem os dedos na boca, nos olhos, têm infecções, estão doentes. Têm que ir constantemente ao hospital. Vimos um médico italiano chorar ao olhar para eles. Da última vez que tive de ir à farmácia comprar medicamentos para o meu filho, paguei 39 euros. Isto não pode continuar. O verão está a chegar. Com o calor, isto vai ser insuportável. Estamos reconhecidos, mas este lugar não foi feito para seres humanos.”
Dawit repete várias vezes que não tencionava vir para a Europa. Professor de inglês, foi obrigado a embarcar para fugir dos combates e, também, da violência de que são objecto os africanos subsarianos. Entre os pais que tiveram a mesma sorte que ele há um estudante de medicina, um engenheiro informático e um tradutor. Alguns deixaram os seus países de origem por causa de perseguições e obtiveram estatuto de refugiados. Todos tinham projectos de vida na Líbia. E todos eles estiveram à beira da morte durante o seu périplo pelo Mediterrâneo.
"As crianças adoecem umas a seguir às outras"
Do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (HCR) às associações humanitárias no terreno, os testemunhos coincidem. No hangar, as tendas distribuídas pela Cruz Vermelha suíça estão alinhadas em três filas de dez tendas cada uma. Cerca de 150 pessoas, incluindo bebés, vivem ali, agrupadas por famílias. À volta do edifício foram instalados contentores com 16 camas cada um onde estão instalados, separadamente, os homens e as mulheres que estão sós.A Jesuit Refugee Service (JRS), uma associação de assistência jurídica e social presente em Malta para apoiar os refugiados diz: “As crianças adoecem umas a seguir às outras. Torna-se crónico e grave”. “Quando as primeiras famílias ali foram instaladas, a primeira reacção foi dizerem que preferiam voltar para o centro de detenção! Via-se voluntários a chorarem quando estavam a distribuir água, leite, carrinhos de bebé ou fraldas. Mas a culpa não é nossa(Europa), resolvam eles os seus problemas.
Este estado de coisas também é válido para aquilo que as autoridades locais e os próprios refugiados chamam Tent Village, a aldeia das tendas, a algumas centenas de metros do hangar. Grandes tendas instaladas a céu aberto, em parte destruídas pelos grandes vendavais de Fevereiro. Mesmo em bom estado, estes abrigos protegem mal da chuva e do vento, e do sol ainda pior como constatou o HCR.
"As autoridades organizam a penúria para encorajarem as pessoas a partir"
“No hangar e na Tent Village, as condições estão abaixo dos mínimos aceitáveis, especialmente para as famílias com crianças”, o HCR de Malte, retomando a linguagem administrativa própria das organizações internacionais. “Os equipamentos sanitários e as condições de vida não são apropriadas para estadias tão prolongadas e estes centros não foram concebidos para pessoas vulneráveis”, diz a HCR.De facto, até agora, nem o hangar nem as tendas tinham alguma vez servido para albergar famílias. E nos últimos meses, quando os barcos deixaram de chegar, estiveram fechados. Porque o acordo sobre migração assinado entre a Itália e a Líbia acabou por dar resultado. “Durante um ano, com excepção de um barco que chegou em Julho passado, não houve mais chegadas”, a HCR, só que com o recrudescer da instabilidade na Líbia e Tunísia essa acalmia desapareceu.
A situação em Hal Far é insustentável. Por causa do isolamento geográfico dos refugiados, vê-se a “guetização” a que são sujeitos. “Nada foi feito para melhorar as instalações. As condições até pioraram”, porque “em vez de tratarem das possibilidades de instalação e integração aqui, as autoridades maltesas apostam tudo na reinstalação ou na relocalização noutros países europeus ou ocidentais. Isso corresponde à estratégia que traçaram. Organizam a dura penúria nas instalações para encorajarem as pessoas a partirem em vez de ficarem cá”, adianta. Por outras palavras, Malta privilegia a emergência para evitar a instalação de recém-chegados e obrigar os seus parceiros europeus a acolhê-los.Coisa que concordo plenamente com o governo de Malta, os Alemães e os Franceses ...que os acolham...
Contexto
Malta e Itália sozinhas perante o fluxo de refugiados
Ou seja, por um lado as autoridades maltesas e italianas continuam a gerir sozinhas as chegadas e, por outro, podem sempre recusar o estatuto de refugiado com o argumento de que a pessoa terá de voltar para o seu país de origem. Por isso, os etíopes como Dawit têm poucas possibilidades têm de obter asilo) e ainda bem para nós), ao contrário dos eritreus, dos somalis e dos sudaneses do Darfour( grande parte são cristãos, mas mesmo assim deviam seguir o caminho dos outros também) para quem o HCR fez recomendações explícitas de protecção.
Não se percebe duas medidas para situações semelhantes.
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